segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Retorno...

Resolvi, enfim, retomar esse blog. Findada a fase de reclusão para estudos, as férias e a inspiração (finalmente) possibilitaram o meu retorno, não inteira, mas a metade que se encontra presente é bem a metade que aproxima minha alma da de Cecília.

À volta, trago um poema verdadeiro. Digo "verdadeiro", pois é o exato do que sinto agora, nesse momento. Infeliz que seja, triste ou solitário... é intensamente real.

Sujeito a minha interpretação, esse poema traduz-se, de forma bastante implícita, na palavra desilusão.
Vejo uma mulher apática, não por vontade própria, mas devido ao decorrer das "paredes fluidas que caminham", das mudanças da vida, da "transparência surda" de uma sociedade na qual apenas vaga, porque viver, de fato, não vive. Ela foge, busca-se em seus versos, procura sua crença em palavras. "Desenha-se involuntariamente", mostra-se e despe-se para encontrar a si mesma nos espelhos que se olha, e admira-se de que é possível, apesar da sua dormência momentânea, ainda estar sempre de olhos abertos tentando, finalmente, se encontrar. No final, há rosas, coisas boas que surgem em seu autoretrato melancólico. Contudo, logo ela se perde e isso ocorre de tal forma que nem ao menos suspira ao ver suas qualidades se desfolharem em seu mundo de apatia.

Enfim... só me resta desejar que eu ao menos note quando minhas rosas desfalecerem. E que o hoje não perdure.... Mas afinal, há solidão feliz?


Desenhos do sonho
Por Cecília Meireles

Eu, mulher dormente, na líquida noite
alargo a ramagem de meus cabelos verdes.
Sigo dentro desse cristal ondulante,
contida como o som dos sinos imóveis.


Surda é a transparência do mundo que ocupo,
onde vago, em vigilância do eterno,
livre do efêmero visível e tranqüila,
e, embora incomunicável, em solidão feliz.



Eu, mulher dormente, de olhos fechados
estou vendo essas paredes fluidas que caminham 

comigo mesma, na cristalina arquitetura: 
muralha de sucessivos patamares à luz de nenhum sol.


Espelhos de quartzo verde em que me reconheço admirada, 

de olhos abertos desde sempre, para sempre,
desenhando-me involuntária, buscando-me exata,
fugindo-me nesta caligrafia que não alcanço.


Ah! dos meus verdes cabelos sobem agora ramos de rosas, 
alta coroa de retrato submerso, frágil e melancólica,
e já me esqueço do que vou sonhando. E nem suspiro 
se as flores se desfolharem nesse planeta de silêncio.





"La Scapigliata", Leonardo Da Vinci, 1508

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